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A popularização das “fake news” e os interesses econômicos por trás do fenômeno

De difícil combate, as notícias falsas ganham força em ambientes com baixos índices educacionais

No século 6, o historiador Procópio escreveu um texto chamado Anekdota com o objetivo de, por meio de informações falsas, arruinar a reputação do imperador Justiniano, o que demonstra que o fenômeno hoje chamado de “fake news” não é recente. Entretanto, com o advento da internet, ele ganhou muito mais força, a ponto de muita gente considerar que estas notícias falsas tiveram um papel fundamental na eleição de Donald Trump.

No ano passado, dois adolescentes de uma pequena cidade da Macedônia, nos Balcãs, ficaram famosos ao serem apontados como os administradores de um site de notícias falsas sobre as eleições americanas com matérias favoráveis ao candidato republicano que geraram milhões de compartilhamentos.
No Brasil, esse fenômeno também é muito comum e notícias como a que diziam que a esposa de Lula havia simulado a própria morte e fugido para a Itália, abundam.

Cabe lembra que o problema é potencializado pelo fato de, cada vez mais, as pessoas utilizarem as redes sociais para se informarem, em detrimento dos grandes veículos de comunicação, segundo pesquisa do Instituto Reuters para o Estudo do Jornalismo. Eram 47% em 2013 e 72% em 2016.

As notícias falsas, inclusive, talvez por serem, geralmente mais espetaculares, geram muito mais engajamento na rede que as verdadeiras, como aponta estudo do site BuzzFeed afirmando que as 20 notícias falsas sobre a eleição americana com maior engajamento no Facebook nos três meses que antecederam a votação geraram mais engajamentos (8,7 milhões) que as 20 notícias reais com mais reações publicadas por grandes veículos (7,3 milhões).

Mas, diferentemente do que muitos podem pensar, o principal motivador da proliferação de fake news não é o puro desejo de caluniar ou ajudar alguém ou alguma instituição, mas simplesmente ganhar dinheiro. Quanto maior a audiência da página, mais ela ganhará com publicidade.

No Brasil, às vésperas do Natal passado, um site chamado Pensa Brasil publicou uma notícia com o título “Lula lutou muito pelo Brasil, não merecia esse juizinho fajuto, diz Gilberto Gil”, ilustrada com uma foto do artista e referindo-se ao juiz Sérgio Moro. Gilberto Gil processou o site, que retirou a notícia, mas, então, ela já havia sido vista e compartilhadas por milhares de pessoas. De acordo com matéria da Folha, o Pensa Brasil teve, em dezembro passado, 701 mil visitantes únicos, com média de três páginas vistas por visita (ou seja, 2,1 milhões de páginas vistas/mês).

Profissionais do mercado publicitário consultados pela reportagem estimaram que os anúncios do site Pensa Brasil rendam de R$ 100 mil a R$ 150 mil por mês, dos quais até 50% ficariam com o intermediário e o restante com o dono do site.

E o Pensa Brasil é apenas um entre os diversos que estão registrados em nome do grupo ou de alguém próximo a eles, como o Brasil Verde e Amarelo, o Diário do Brasil, a Folha Digital, o Juntos pelo Brasil, o Jornal do País, o Saúde, Vida e Família, o Você Precisa Saber, o Em Nome do Brasil, a Folha de Minas, o The News Brazil e o Na Mira da Notícia.

A maioria dos sites desse tipo são registrados fora do país, não identificam os autores dos textos e não publicam expediente, endereço ou telefone para contato. Apesar disso, Beto Silva, dono do site Pensa Brasil, aparentemente, não se constrange em dizer tudo o que pensa quando consegue ser encontrado. Em entrevista para a Folha, afirmou: “O que fazemos são modificações [sobre o noticiário] para tornar a notícia mais fácil e interessante (…) Quem tem de saber o que é verdade ou mentira é quem lê a matéria.” E disse, ainda: “Acredito que a verdade não existe. Isso é o meu ponto de vista (…) Tudo é business, tudo é dinheiro. Ninguém faz isso para contar historinha”.

Curiosamente, muitos que compartilham notícias falsas o fazem mesmo cientes disso. Segundo artigo da pesquisadora americana Judith Donath, do Centro Berkman Klein para Internet & Sociedade da Universidade Harvard, na era das redes sociais, não se compartilha e curte notícias apenas para informar ou persuadir, mas “como um marcador de identidade, uma forma de proclamar sua afinidade com uma comunidade particular”. Interagir com uma notícia falsa, argumenta, pode enfurecer os de fora dessa comunidade, mas é um “sinal convincente de fidelidade ao seu grupo”.
Apesar da dimensão do problema e da relativa facilidade de se encontrar os grandes disseminadores de notícias falsas, entretanto, a solução para o problema não é tão fácil, pois qualquer medida para coibí-las poderia afetar um direito fundamental em muitas sociedades, que é o da liberdade de expressão, como coloca Patricia Blanco, presidente do Instituto Palavra Aberta, organização dedicada à promoção da liberdade de expressão: “Como garantir uma web livre e evitar que ela seja usada de forma criminosa é algo que temos de resolver. Mas não podemos deixar que o legislador, para proteger cidadãos, crie limites à liberdade de expressão.”

Autor do livro “O que Aprendi Sendo Xingado na Internet” (Leya), Leonardo Sakamoto, da ONG Repórter Brasil e blogueiro do UOL defende também, como solução a médio prazo, uma “alfabetização midiática”, com noções, nos ensinos fundamental e médio, de sobre como detectar argumentos fraudulentos. Sugestão, esta, reforçada por estudo do Instituto Paulo Montenegro e da ONG Ação Educativa mostrando que 92% dos brasileiros em idade economicamente ativa, entre 15 e 64 anos, são incapazes de se expressar por textos, de opinar sobre argumentos e interpretar tabelas e gráficos. Nos EUA, pesquisa da Universidade Stanford com alunos de ensinos fundamental e médio e de faculdades revelou que a maioria é incapaz de diferenciar notícias produzidas por fontes confiáveis de anúncios e informações falsas.

Infelizmente, esta não é uma notícia falsa.

FONTE: CNSEG : http://www.cnseg.org.br/cnseg/servicos-apoio/noticias/a-popularizacao-das-fake-news-e-os-interesses-economicos-por-tras-do-fenomeno.html

 

Escrito por  Cnseg