Em tempos de crise, buscar alternativas é o melhor caminho e conhecer experiências bem-sucedidas torna essa trajetória mais segura. Com essa convicção, cerca de trezentas pessoas do setor de saúde suplementar, agentes reguladores e gestores de recursos humanos de empresas contratantes de planos de saúde se reuniram, nesta quarta feira (31/8), durante o ‘Seminário Internacional Novos Produtos para a Saúde Suplementar’, realizado pelo Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), no Rio de Janeiro.
No encontro, José Cechin, diretor-executivo da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), integrou a mesa de debate sobre ‘Contas de poupança de saúde e franquias anuais no contexto da saúde suplementar do Brasil’. Na avaliação de Cechin, a contínua expansão dos custos na saúde e a dificuldade dos empregadores manterem o benefício demandam mobilização de todos os agentes do setor. “É muito importante debater sobre novos produtos. É uma discussão inédita e nos oferece a oportunidade de analisar a experiência internacional”, afirma.
O executivo da FenaSaúde alertou para os desafios e sobre a urgência em adotar ações necessárias para conter a evolução dos custos. “É preciso pensar em meios para viabilizar produtos que tornem a saúde mais acessível para todos. O empregador não quer interromper o beneficio do plano de saúde, mas também não pode arcar com um custo que cresce por anos sucessivos a taxas muito altas. Portanto, precisamos pensar e discutir alternativas”, avalia.
De acordo com Cechin, o plano com acumulação – modelo que o beneficiário utiliza parte de sua renda para fazer contribuições periódicas para uma conta capitalizada – incentiva o empregado a poupar, durante a vida ativa, recursos para custear, total ou parcialmente, os gastos com saúde no período pós-emprego. “Experiências e produtos apresentados empoderam o consumidor na medida em que ele passa a ter conhecimento dos custos, o que o torna mais consciente para fazer escolhas.”
Especialistas nacionais e internacionais – Entre as razões para debater sobre novos produtos, o superintendente executivo do IESS, Luis Augusto Carneiro, revelou que um dos motivos é as despesas ascendentes para as empresas contratantes – prova disso são os custos dos benefícios de saúde na folha de pagamento, que passaram de 10,38%, em 2009, para 11,54%, em 2015, de acordo com o executivo. “Os planos de conta poupança e franquias anuais são mais uma opção; o consumidor passa a ter mais alternativa. Isso faz crescer a competição setorial e dá maior poder ao beneficiário na escolha do atendimento, além de incentivar a parcimônia e seletividade no uso.”
Carneiro explicou como pode funcionar a franquia anual: o beneficiário paga pela maioria dos serviços até chegar ao valor da franquia – não há franquia para procedimentos preventivos. Depois de atingir o valor da franquia anual, o plano paga por todos os serviços dentro da cobertura. “A grande vantagem é que, até atingir a franquia anual, os valores a serem pagos são arcados com os fundos da conta poupança”, explica Carneiro. De acordo com o superintendente do IESS, essa categoria de plano foi bem aceita no mercado norte-americano e o numero de beneficiários cresceu de 2% para 20%nos últimos dez anos.
Para se tornar realidade no Brasil, segundo o executivo, é preciso adaptar a resolução CONSU 8 (3/11/1998), que veda a venda de planos com franquia nos quais o beneficiário tem que arcar integralmente com os custos de serviços de saúde. Além disso, é preciso ainda estabelecer quais procedimentos de prevenção e promoção à saúde, com comprovação de custos e efetividade, estariam isentos da cobrança da franquia anual.
Desafios – A apresentação de César Lopes, líder de Saúde e Benefícios em Grupo da Willis Towers Watson, buscou demonstrar como as empresas que contratam planos de saúde enfrentam os custos crescentes. “Quando um empregado fica sem o plano de saúde, três ou quatro outras pessoas ficam sem cobertura de saúde. Isso acontece porque a cobertura de assistência médica também abrange os familiares”, detalha.
Na avaliação do especialista, a relação entre custo com o benefício e a folha de pagamento cresce de forma acelerada. Em 2004, era de 7,6%. Para 2034, a projeção prevê 27,0%. “Concluímos que a divisão de responsabilidades é um caminho, afinal o benefício é altamente valorizado pelos empregados e seus dependentes. Coparticipar significa participar juntos”, enfatiza Lopes.
Essa também é a avaliação de Denise Horato, diretora de Recursos Humanos da Roche Farma Brasil, que trouxe para o evento o ponto de vista do RH. Sua empresa trabalha com dois modelos de gestão e duas operadoras: plano administrado (desde 1993) e plano pré-pago (desde 2011). No plano administrado, os sinistros são acima da média e crescimento de budget tem acompanhado a inflação geral. Já no plano pré-pago, a sinistralidade foi controlada nos últimos anos e o impacto no reajuste contratual é próximo à inflação médica.
Experiências internacionais – Ronaldo Ramos, atuário da Global Health Swiss, apresentou a experiência americana da conta de poupança de saúde e franquias anuais para financiar a assistência médica. Segundo o especialista, os gastos dos EUA com a saúde nacional foi de $3 trilhões em 2014, ou 18% do PIB. No entanto, nos últimos cinco anos, as taxas de crescimento ficaram próximas das do PIB/IPC. “A maior parte da cobertura de plano de saúde nos EUA é oferecida por empregadores, devido em parte à dedutibilidade fiscal de prêmios para planos financiados pelo empregador.”
De acordo com Ramos, os tipos de planos de assistência gerenciada dos EUA são:
- Health Maintenance Organization (HMO): os contratantes nesses planos, normalmente, só podem consultar médicos da rede.
- Preferred Provider Organization (PPO): regidas por leis menos restritivas que as das HMOs, os contratantes têm mais liberdade para fazerem consultas fora da rede, mas a um custo maior.
- Ponto de serviço (POS): os consumidores escolhem um médico de assistência básica que controla as indicações.
- Planos de saúde voltados para o consumidor (CDHP): foram introduzidos com o intuito de ajudar a mudar o gerenciamento de custos médicos do plano de saúde para os membros, tornando-os financeiramente responsáveis pelos custos com assistência. Os CDHPs são planos de franquia anual, vinculados, geralmente, a contas de poupança ou de reembolso não tributáveis para pagar despesas médicas abaixo da franquia.
Entretanto, de acordo com Ramos, os desafios globais do plano de saúde de previdência privada envolvem prêmios de plano médico para aposentados e descontinuidade de benefícios. E uma das soluções está na assistência médica de aposentadoria pré-financiada – modelo que retém um fundo de poupança de saúde com o propósito único de pagar prêmios de plano de saúde para aposentados e coparticipações de plano de saúde (franquia, cosseguro e coparticipações fixas).
“Isso possibilita a continuação do plano de saúde atual na aposentadoria, uma vez que o estabelecimento de preço é antecipado para ser mais baixo do que o do mercado amplo. A cobertura é feita por prêmio, não por custo/reembolso, e os subsídios de custo necessários, entre os grupos de aposentados saudáveis e doentes, são mantidos”, explica Ramos.
Outra experiência apresentada foi a de Beverly Beaudreault, diretora sênior de Benefícios da Roche Farma. Ela relatou que a variabilidade nos custos com assistência médica é causada pela participação, subsidiação e eficiência do plano, ou seja, a participação de funcionário e dependente tem previsão mais importante de custos com assistência médica por empregador.
A subsidiação permite que valor e subsídio do programa definam compromissos financeiros com base no valor geral. E, ainda, definir a estratégia de fornecedores e parceiros determina quais entidades se posicionaram melhor para ajudar a cumprir sua atuação.
Assim como no Brasil, a variação de preços de procedimentos é um grande desafio para o setor de saúde norte-americano. “Os custos para o mesmo serviço ou procedimento médico podem variar bastante de uma operadora para outra, por exemplo: a mesma ressonância magnética pode custar $500 em uma operadora e $3.000 na outra.”
Beaudreault explicou que os planos cobram do funcionário somente o pagamento da coparticipação para serviços médicos: “Isso mascara o custo real do serviço oferecido. O funcionário pode pagar somente $50 de coparticipação por uma ressonância magnética, independentemente se a operadora cobra $500 ou $3.000. Esses fatores, bem como os custos crescentes e a reforma recente da legislação de assistência médica, deram origem ao conceito de consumismo em saúde”.
Karla Coelho, diretora de Normas e Habilitação de Produtos, da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), estava entre os debatedores e concluiu: “Essa é uma discussão muito importante para o setor de saúde. É um momento fundamental para pensar como inovar nesse segmento e trazer valor em saúde”.
Escrito por Luís Lima